SOBRE A SÍNDROME DE ANGELMAN
SOBRE A SÍNDROME DE ANGELMAN
A síndrome de Angelman (SA) é uma doença neurogenética rara decorrente da perda de função do gene UBE3A no alelo materno do cromossomo 15.
As crianças e os adultos com SA têm problemas de equilíbrio, deficiência motora e podem ter convulsões debilitantes. Alguns indivíduos nunca andam. A maioria não fala. O sono perturbado também pode ser um sério desafio para o indivíduo e para quem cuida dele. Os indivíduos com SA necessitam de cuidados contínuos e não conseguem viver de forma independente na vida adulta.
Pesquisadores estimam que a síndrome de Angelman afeta uma em cada 15.000 pessoas. Com base nesta prevalência estimada, o Brasil pode possuir uma população de aproximadamente 13.500 indivíduos com síndrome de Angelman, tomando como base a população de aproximadamente 203 milhões de brasileiros (Censo 2022). Infelizmente apenas uma ínfima porção desta população possui o genético molecular capaz de confirmar o diagnóstico correto da síndrome de Angelman. Indivíduos que nunca foram testados em exames genéticos podem estar erroneamente diagnosticados, por exemplo, com paralisia cerebral, transtorno do espectro do autismo, atraso global do desenvolvimento, dentre outras condições.
É essencial promover a conscientização sobre os sinais da síndrome de Angelman entre profissionais de saúde, famílias e sociedade em geral, e incentivar o acesso a testes genéticos confiáveis e rápidos - tendo em vista a importância do diagnóstico precoce em função dos seguintes motivos:
1. Gerenciamento adequado da epilepsia:
Cerca de 80% dos indivíduos sofrem de diferentes tipos de crises epilépticas. O diagnóstico precoce é vital para o tratamento adequado das crises, já que estas podem ser agravadas caso sejam administrados medicamentos como vigabatrina, carbamazepina e fenobarbital, considerados medicamentos de "primeira linha" no tratamento de crises epilépticas na população geral. Além disso, indivíduos com síndrome de Angelman que utilizem medicamentos derivados do ácido valpróico podem sofrer efeitos colaterais nocivos relacionados às habilidades motoras. Ou seja, o diagnóstico da síndrome de Angelman é necessário para que o indivíduo seja medicado adequadamente e sejam evitadas complicações do quadro neuromotor.
2. Estimulação precoce da criança:
A estimulação precoce é essencial no desenvolvimento cognitivo e motor da criança com síndrome de Angelman. Intervenções como fisioterapia, terapia ocupacional, fonoterapia, comunicação aumentativa e alternativa, dentre outras, devem começar o mais cedo possível na vida destas crianças com objetivo de otimizar os ganhos na janela de oportunidade que somente a primeira infância (até os 6 anos) oferece em termos de neuroplasticidade. O diagnóstico precoce permite que as intervenções terapêuticas possam ser iniciadas o mais cedo possível e permite que as crianças com SA aproveitem plenamente esse período crítico de neuroplasticidade. A ausência de estimulação adequada pode trazer prejuízos ao indivíduo em habilidades funcionais, qualidade de vida e desenvolvimento cognitivo e neuromotor.
3. Prevenção de Múltiplos Casos de síndrome de Angelman em uma mesma família:
Ainda que ocorra em uma pequena parcela das famílias, deve-se levar em consideração que há dois tipos de disfunções no gene UBE3A ligado ao fenótipo da Síndrome de Angelman que podem vir a ser transmitidos hereditariamente. As mulheres que carregam essas mutações de forma silenciosa, não manifestando em si mesmas a síndrome, têm 50% de chances de transmiti-la aos filhos. Portanto, o diagnóstico genético precoce não só confirma a condição no indivíduo, mas também é fundamental para o planejamento familiar por meio do aconselhamento com médico geneticista.
Atualmente, o tratamento da Síndrome de Angelman concentra-se no manejo dos sintomas e na promoção da qualidade de vida e autonomia dos indivíduos, por meio de uma abordagem multidisciplinar que deve incluir fisioterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia, análise do comportamento e psicopedagogia, dentre outras áreas. O acompanhamento médico deve ser contínuo ao longo da vida, com destaque para o papel fundamental do neurologista, além de outros especialistas como ortopedista, oftalmologista e gastroenterologista - que monitoram e tratam as diversas complicações associadas à condição.
Atualmente estão em andamento, no exterior, 20 programas de pesquisa em fase pré-clínica, além de 4 estudos clínicos de medicamentos experimentais ativos. Por ser uma doença monogenética (que afeta apenas o gene UBE3A no cromossomo 15 materno) a Síndrome de Angelman é considerada um alvo promissor para futuras terapias gênicas.
As pessoas que convivem com a Síndrome de Angelman, assim como suas famílias, enfrentam diversos desafios diários, como, por exemplo:
Inclusão escolar: Crianças com Síndrome de Angelman enfrentam dificuldades significativas na inclusão em escolas regulares, devido à falta de preparo das instituições para lidar com suas necessidades específicas. A ausência de planos educacionais individualizados e de profissionais qualificados que compreendam as particularidades da síndrome resulta em barreiras ao aprendizado. É crucial promover um ambiente inclusivo que ofereça apoio pedagógico adequado, incluindo o uso de comunicação aumentativa e alternativa.
Acesso à saúde: Tanto na rede pública quanto na suplementar ainda há grandes lacunas no atendimento especializado às pessoas que vivem com a Síndrome de Angelman. A carência de profissionais de saúde com experiência nessa condição frequentemente resulta em diagnósticos tardios ou incorretos, além de manejos clínicos inadequados. É necessária a implementação de centros de referência para a síndrome de Angelman, assim como é importante o fortalecimento dos centros de referência em doenças raras em todo o território nacional.
Programas para jovens e adultos: Há uma carência significativa de serviços e programas de suporte voltados para jovens e adultos com Síndrome de Angelman. A transição para a vida adulta traz novos desafios, como a necessidade de programas de reabilitação, moradia assistida e inclusão social. A ausência de políticas públicas voltadas para esta faixa etária pode colocar indivíduos em situações de desamparo.
Risco de abuso: Devido às limitações cognitivas e de comunicação, indivíduos com Síndrome de Angelman são especialmente vulneráveis a situações de abuso, seja físico, emocional ou sexual. A ausência de fala funcional torna extremamente difícil a denúncia ou identificação de abusos, evidenciando a necessidade de políticas de proteção eficazes e de acompanhamento contínuo para garantir a segurança desses indivíduos.
Vulnerabilidade social: Muitas famílias com crianças com Síndrome de Angelman enfrentam situações de vulnerabilidade social, sendo comum a sobrecarga sobre a mãe, que frequentemente se torna a única provedora e cuidadora. Essas mães, muitas vezes, precisam abandonar suas carreiras para cuidar integralmente do filho, o que pode levar a dificuldades financeiras, isolamento social e uma carga emocional extremamente pesada.